sexta-feira, 24 de abril de 2009

OFERENDAS


A TEOLOGIA DAS OFERENDAS


Tudo isso explodiu no Cristianismo sem dificuldades ou óbices de qualquer espécie. Cristo nunca se referiu à fundação de nova religião, nem insinuou uma vez sequer uma separação do judaísmo.

Os Apóstolos e os primeiros cristãos continuaram freqüentando o templo e as cerimônias litúrgicas dos judeus (Lc 24,53; At 2,46; 3,1 etc.). O próprio Jesus dissera:

"Não penseis que vim revogar a Lei e os Profetas. Não vim revogá-los, mas dar-lhes pleno cumprimento, porque em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, não será omitido nem um "iota", nem um "til" da Lei, sem que tudo seja realizado" (Mt 5,17-18).

Por causa dessa afinidade e continuidade, todo o aculturamento religioso que não conflitava com a doutrina de Cristo penetrou nos rituais litúrgicos da Igreja. Principalmente na Fração do Pão, a Eucaristia, de que os sacrifícios israelitas eram "figura" (1 Cor 10,6.11; Rm 15,4; Hb 9,24; Gl 4,24-26):

"Pois a minha carne é verdadeiramente uma comida e o meu sangue é verdadeiramente uma bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele" (Jo 6,56).

"...Jesus tomou o pão e, depois de dar graças, partiu-o e disse: 'Isto é o meu corpo, que é para vós; fazei isto em memória de mim.' Do mesmo modo, após a ceia, também tomou o cálice, dizendo: 'Este cálice é a nova aliança em meu sangue; todas as vezes que dele beberdes, fazei-o em memória de mim" (1 Cor 11,23-25).


Jesus se apresenta como a vítima, a própria oferenda, a essência de todo o sacrifício e desde o Antigo Testamento fonte da comunhão do Homem com Deus. Quando anuncia a Ceia Eucarística (Jo 6) os judeus arrepiam-se ao ouvirem-no falar em "comer a sua carne" e "beber o seu sangue".


Compreenderam, aculturados tal como seus antepassados, que Jesus seria a vítima ou hóstia do sacrifício (Jo 6,69). Da mesma forma sentiram profunda aversão, culturalmente comprometidos, com a modificação em "beber o sangue", o que lhes fora sempre vedado (Lv 12,16.23). O sangue era considerado "a sede da vida":

"Porque a vida da carne está no sangue. E este sangue eu vo-lo tenho dado para fazer o rito de expiação sobre o altar, pelas vossas vidas; pois é o sangue que faz a expiação pela vida" (Lv 17,11).

Já os primeiros cristãos compreenderam que o sacrifício que lhes era entregue era o de comunhão, pois dele comeriam todos, tal como na refeição sagrada, e ao "beberem o sangue" beberiam a "Vida de Cristo". Tanto é assim que São Paulo o compara com os sacrifícios pagãos distinguindo-os do sacrifício israelita (1 Cor 10,14-20). Destaca além do caráter sacrificial dele, também o caráter sacramental pela "comunhão com o corpo e com o sangue do Senhor" (1 Cor 10,16), dEle recebendo a vida divina, a graça:

"Assim como o Pai, que vive, me enviou e eu vivo pelo Pai, também aquele que de mim se alimenta viverá por mim..." (Jo 6,57).

Receber a Vida de Cristo é santificar-se, "cumprindo em plenitude o que os sacrifícios antigos prefiguravam" (Hb 9,9-14). Jesus vincula o seu sacrifício à Aliança do Sinai (Ex 24,8), "cumprindo-a" (MT 5,17-18):

"Este é o Cálice da Nova Aliança em meu Sangue..." (! Cor 10,25).

"Este é o Sangue da Aliança que Iahweh fez conosco..." (Ex 24,8).

Assim, cada vez que se celebra a Eucaristia e se come e se bebe o corpo e o sangue do Senhor, o sangue dEle é aspergido em todo o "corpo místico de Cristo", a Igreja (Ef 1,22-23; Col 1,18), "santificando-o". "Perpetua" a Aliança de Moisés (Ex 24,8) e o "sacrifício da cruz" (Sacrosanctum Concilium n.º 47). Jesus é o "Santo de Deus" (Jo 6,69).


Não há um só elemento “em figura” nos sacrifícios israelitas que não esteja “em plenitude” no Sacrifício da Eucaristia. Para Ela é que se convergem, da mesma forma, as oferendas, não mais como a herança de uma tribo ou sacerdotal, mas a herança do Corpo Místico de Cristo em toda a plenitude. É também, até mesmo pela simples entrega delas, a unificação de todos, material e es-piritualmente, santificando-se na oferenda consagrada, ao comer cada um e todos a hóstia (=vítima) santa, antecipando-se o Banquete Messiânico (Lc 22,18; 1 Cor 11,26) da Comunidade Eclesial en-tão formada, pela manducação do Corpo do Senhor. Jesus é a própria oferenda, não como entre os Israelitas onde Deus se significava nela para alimentar uma tribo; agora é o próprio Jesus Res-suscitado, o Filho de Deus Vivo, o Santo de Deus, que alimenta o Seu Próprio Corpo, unificando-O e santificando-O:

"Já que há um só pão, nós, embora muitos, somos um só corpo, visto que todos participamos desse único pão ... aqueles que comem as vítimas sacrificadas não estão em comunhão com o altar?" (1 Cor 10,17).

Com as oferendas depositadas no altar durante o Ofertório, na consagração da hóstia, atinge-se a comunhão com Deus e com os irmãos, no Corpo Místico de Cristo e recebendo o próprio Cristo, no corpo e sangue, o cristão volta a refletir a "imagem de Deus" perdida pelo pecado:

"E nós que, com a face descoberta refletimos como num espelho a Glória do Senhor, somos transfigurados nessa mesma imagem, cada vez mais resplandecente, pela ação do Senhor, que é Espírito" (2 Cor 3,18).

De tudo o que foi exposto conclui-se que a oferenda é um culto a Deus, a participação do “trabalho humano”, tal como se diz no início da Missa, na constituição material da vítima (=hóstia) consagrada, a oferenda santa por excelência, o próprio Corpo e Sangue de Cristo, a essência do sacrifício, a unificação, centro e ápice da comunhão e santificação da Igreja, em plenitude. Com a oferenda se participa na Obra de Santificação de todo o mundo pela santificação de uma parte. É ser vítima consagrada com Cristo, em união plena e indissolúvel. Faz-se parte de toda a atividade da Igreja tal como o Catecismo enseja, participando de toda a satisfação das “necessidades dela, de forma que ela possa dispor do necessário para o culto divino, para as obras apostólicas e de caridade e para a honesta sustentação de seus ministros”. Além de vítima ou hóstia o fiel deve ter consciência da sua participação também em todo ato litúrgico, tanto nos demais sacramentos, onde está presente materialmente com o fruto dos rendimentos de seu trabalho, bem como em toda e qualquer obra da ou ato Igreja, sem outro interesse que a comunhão com Deus, nunca a espera de qualquer recom-pensa ou fortuna. Não é um negócio que faz com Deus, é um ato litúrgico, um culto.